Castelo de legos


Com as palavras construo pontes e castelos, como se de um jogo de legos se tratasse.
Têm cores, os sentidos,
têm lugar, as formas.
Mas é apenas no conjunto que a dimensão se concretiza.

As palavras visito-as por vezes, quando há sentidos que jazem por dizer. E fica por isso, um silêncio barulhento, ruidoso, incómodo, que faz tremer o castelo de legos.

Consegues ouvir? Inclina a cabeça. Vem do chão, perto da muralha.

Se olhares bem, tem quatro paredes, oito portas e uma janela que a força da corrente já encerrou. Com três cobertores, às vezes ainda faz frio.

Como vês, é mais fácil sair do que ficar. Do lado direito o oxigénio não chega. À esquerda reina um turbilhão denso e ruidoso.
Repito, é mais fácil sair do que ficar. Espreitar e voltar a sair.

Mas vou contar-te um segredo. Baixinho, ninguém nos ouve. A noite está em silêncio há horas. É tarde, deve ter adormecido…
Estou certa, ninguém nos ouve.

Nesse castelo de que te falei existe um acesso secreto. Diz-se que é nesse lugar que se encontra a chave que permite abrir o septo que separa os dois lados. E uma vez aberto, o oxigénio inunda a tempestade que se desfaz em silêncios e, de súbito, as paredes fundem-se com as portas, transformando-se em aquedutos.

A brisa dissipa a muralha, a corrente e o frio.
Dissolve o sonho em pedaços de luz.

Ao coração, hoje chamo-lhe castelo de legos. E visito-o através das palavras. Eternas e fieis, presentes mesmo quando a noite adormece.