Um dia destes falaram-me do Fernando Pessoa consciente da dor de pensar. Pensar é estar doente dos olhos, dizia Caeiro. Na verdade, pensar é uma condição, às vezes necessária e suficiente, para trazer à mente e ao espírito a consciência dos obstáculos, mágoas e fragilidades. E a consciência amplifica a dor, porque a devolve presente (e permanente enquanto dura).
Por outro lado, há quem acredite que longe da vista, longe do coração. Diria antes, longe do coração, longe do pensamento. Porque na verdade, a distância não apaga a consciência, embora contribua para tornar difusas as memórias, porque estas não estão continuamente a ser estimuladas.
Não penso que a atitude de pensar seja errada (e isto é a prova) ou que substitua aquela que respeita ao sentir. Quando muito, é desnecessária, se esperamos que o pensamento resolva, quando neste nada existe de concreto, palpável. Mas não resolvendo pode tornar algo resolúvel. Diz a tradição budista que os pensamentos movem o mundo. Os pensamentos como base e combustível para algo de realizável.
Desnecessária e dolorosa também, se não conseguirmos arrumar a vida em prateleiras estáveis e continuarmos a circular, sem perspectivas de ancorar a história em porto seguro.
Mas apesar de tudo isso, (que não é pouco), pensar contrasta com a atitude impulsiva e por vezes pouco sensível daquele que reage sempre, (defendendo-se dele próprio); é a forma de encontrar as razões que ajudam a fechar gavetas e ajustar os factos e os não factos nas prateleiras; é aquilo que pode permitir amadurecer a mágoa porque confronta o presente com o egoísmo próprio, que esquecemos mais facilmente do que o egoísmo alheio; é, no fundo, o mecanismo interno, abstracto, que leva a razão a escrever o verbo perdoar.
Reformulando: Do conflito à consciência. E desta ao ponto final.
(pensar mal é estar doente. Mas saber pensar é quase sempre motor de vitalidade.)
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